terça-feira, 19 de outubro de 2010
Naquele dia nada me distraia, nem a vontade de limpar o apartamento sujo de vinho, nem as louças quebradas, o chuveiro pingando, as porções de comida mau jantadas, o cinzeiro sujo, os lençóis no chão, e ainda parecia que chovia, nem era garoa,nem vendaval, estava só molhando a terra mau agradecida. Os carros passando apressadamente como quem vai à um enterro, as pessoas nervosas como quem vai tirar o pai da forca, mas dentro do quarto parecia que o mundo estava mudo e só me cabia la dentro, eu e minhas unhas roídas a manhã toda, o cabelo suado, o corpo exaurido e parecia até aquela hora eu ainda escutava os gritos da noite anterior, uma porção de pessoas bateram à porta do apartamento querendo saber o que havia acontecido, mas nem eu sabia na verdade.Só queria sumir, não morrer, mas deixar a vida levar, procurar um substrato.Nada era como antes, ninguém mais entendia ninguém, tudo parecia sem lógica, sem vontade de continuar, de ser o que estava sendo, tantas vezes brigamos, mas naquela noite o copo parecia estar transbordando, e a sensação há dias era de ver sempre o copo meio vazio, fazia tempo que já não o víamos meio cheio.Odiando as coisas vistas pelo lado positivo, como se tudo na vida desse certo, eu odiava ver aquilo nas pessoas, aquela alegria de quem ganha na loteria todo o dia, a vida não é assim, as pessoas se desanimam também, tem seus dias chuvosos e não dá pra ficar distribuindo sorrisos por aí .E, misteriosamente justamente na noite que eu havia preparado um vinho, um jantar (quase) feito por mim , veio me dizer que não queria mais, que poderíamos ser amigos,mas que se continuássemos acabaríamos nos ferindo mais.Foda-se amizade, eu quero ser sua mulher eu disse, e eu sabia que iria chegar, essas noites mau dormidas, essas mordidas de brincadeira quase que reais, os arranhões de raiva e paixão iria dar nisso.O vinho derramado fora atirado conscientemente pra acertar, as facas foram todas escondidas estrategicamente, o sangue foi o meu, eu o cuspi, e não sei porque da minha garganta saiu sangue, acho que eram as palavras guardadas gotejando, como elas não saíram, algo bem parecido com o que eu sentia deveria sair, e foi o sangue.
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