sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Curta metragem sobre Praça da Cultura

Meus alunos do 9° ano do Colegio João Silva, produziram um curta-metragem sobre as praças de Imperatriz, hoje estou postando o video sobre a Praça da Cultura. Em breve postarei os outros...

terça-feira, 27 de novembro de 2012


E se eu te amo na quarta,
Não te amarei na quinta.
Isso pode ser verdade.
Porque você reclama?
Te amei na quarta sim, e daí?"

Edna St. Vincent Millay

sábado, 24 de novembro de 2012

Agonias Ilustradas, de Jeferson Bandeira


Release

Agonias Ilustradas (2012), de Jeferson Bandeira, é um livro-baralho, composto por 108 micronarrativas, divididas em 3 partes: Breviário ("o primeiro baralho"), Obsoleto ("o segundo baralho") e Cartas na Manga, que pode ser visto como um "extra". Cada página do livro corresponde a uma carta de um baralho, num jogo que pode possuir vários ritmos, dependendo do grau de interação e leitura de quem o abre para ler. Nas palavras do autor, "vislumbra-se o flerte: poesia & micronarrativa. Funde-se outra literatura, não estanque, avessa às alturas. Impolidas linhas que tramam na incultura. Fluido móvel, berço ou lápide da descompostura. De hirtos espinhos, flor que se inaugura. Enfim rompidas, encalacradas aparências. Faz-se convertido, cada ponto final em reticências". 

O livro se inicia com uma micronarrativa que aponta para a metaleitura ficcional:
O inusitado

Abre-o. No curto folhear, assoma a página. Pesa o dedo sobre ínfimo léxico. Força, nota pulso, até que rompe. Do rasgo hemorrágico, mina o jorrar d’um mundo mágico e plausível.



E o livro se encerra com uma micronarrativa provocativa e intrigante: 
Multifuncional
Na identidade, masculino. No jeito de ser, feminino. No trabalho, o que o cliente pedisse.

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Pré-suposto

O semblante era o de uma puta que acaba de ser autuada por danos morais
Seu olhar acompanhava o corpo que impetuosamente se jogaria em frente ao próximo carro que passasse. Estava destinada a morrer de amor ou de acidente, o que dá no mesmo, porque quem não escolhe a quem amar e não tem a recíproca está decididamente entrando em um acidente fatal.
Há uma ética nisso tudo?
Estabelecer os parâmetros de quanto se deve sofrer e por quanto tempo se deve amar? Ela achava que uma paixão tem prazo de validade e deveria durar o tempo de uma noite calorosa, jamais dar tempo suficiente pra conhecer os gostos e os desgostos e fora assim que seu cérebro(sim, é o maldito cérebro que se encarrega de seletivar os cretinos que entrarão em nossas vidas) se afetuou por um belo par de olhos grandes e reluzentes. Poderia ser uma bunda, umas pernas, mas os olhos era de uma singularidade digna de qualquer poeta, sua escuridão permanecia intacta. O que dava raiva não era não ser correspondida, é que nem por engano ele olhava para ela, não conseguia notar e nem permanecer com os olhos nela. Seja na fila de um banco, ou na mesa de um bar, qualquer flerte segue um padrão de olhares furtivos, nada exageradamente criativo, a naturalidade da coisa, essa era a ética destinada aos olhares, entretanto ela quebrara todos os parâmetros e já não utilizaria a discrição como parte do processo da conquista. Descobrir um nome, um número de telefone, um esbarrão em algum supermercado, qualquer coisa que ele tivesse de parar cinco segundos ao menos para xingar ou pedir desculpas, não importasse o que aconteceria, o importante seria parar de procrastinar. Qualquer diálogo ou até solilóquios serviria, então ela para e pensa como é difícil ser difícil em tempos fáceis, em que qualquer mulher adiciona algumas palavras difíceis, bonitas e interessantes nas redes sociais e se passa por inteligente. Como competir com tanta pose exposta, e ela sem nada a retibruir a não ser as amarguras de uma pré-adolescência cheia de traumas ( e quem não os tem?!), espinhas, menstruação atrasada, pais divorciados, foras, comida estragada, bebida demasiadamente quente, sexo aleatório, contas não pagas, traições não vingadas e todas as outras coisas nas quais a gente coloca a culpa pra se sentir melhor. Poderia dizer que curte jazz, mas como saber se ele não tem ranço ao escutar boa música? É compreensível que ele possa ter defeitos, afinal porque raios alguem teria olhos tão perfeitos se não tivesse uma unha encravada, ou sífilis, incontinência urinária, ou algo do tipo? Então porque continuar com essas tentativas inúteis sem saber o que pode ser encontrado?!
A solução dos dias de insonia e masturbação veio ao lembrar que além do espírito investigativo existem informantes que se  vendem por algumas cervejas, entretanto sua indiscrição ultrapassaria o grau permitido se um desses investigadores fosse amigo do dito cujo, mas a essa altura do campeonato qualquer atitude seria válida. A história da história da vida real se confunde com os atrativos da criatividade do inverossimel quando se percebe que as coisas ja foram mais fáceis quando o homem das cavernas se interessaria por qualquer mulher das cavernas que tivesse uma abertura suficiente para seu orgão progenitor, o fato é que hoje em dia a mulher das cavernas tem que gostar de Chico Buarque, Caetano Veloso, assistir filmes de Wood Allen, viajar pra Europa, ter cd dos Beatles para que ocorra uma segunda ocasião além do primeiro ato. Era tão mais fácil viver sem a ética do bom gosto, dos bons costumes e tudo se resumia ao que era ou não carnal. Até chegar ao investigador mais próximo e gastar as economias servindo cerveja e petisco e pedindo as informações necessárias para a segunda investida, entretanto ao fisgar as devidas informações a última coisa que o Sherlok Holmes de quinta disse é que o "my precious" era seu bofe divino, que talvez um dia quem sabe eles quisessem experimentar algo com alguém tão desinteressadamente mulher, ela não seria convidada.

Renovar, dia a dia, sol a sol, renovar! [Confúcio]

Não me espanta que todo dia a saudade se renove
Afinal, esse é o lixo nostálgico de que tanto falava Gabriel Garcia Marquez
Cada letra de uma musica ou de um poema tenta expurgar todo o sentimento
De que um dia fomos dois.

Vou apodrecer remoendo a vida
Lembrando infinitamente as nossas rotinas
Nem sempre a lembrança vem em forma de saudade
As vezes é so uma constatação

Sou tão família, tão carente
Tão bordada entre carinhos e maus tratos
Afinal, poderei eu acusar alguem de solidão?


 Durmo horas pensando em acordar
Pensando ser perda de tempo esse sono profundo
Esquecer um pouco no que me transformei
Não procuro a morte, mas o desejo de hibernar e acordar em outra dimensão é latente

Escuto escondidas as piores canções que alguém machucado poderia ouvir
Nas minhas poucas letras há uma denúncia de quem espera os frutos de um novo tempo
Não sei bem explicar, se é vida, se é morte, se é tempestade
O que aparece é cada vez mais nefastp.

domingo, 11 de novembro de 2012

António Botto


Tenho a certeza De que entre nós tudo acabou. - Não há bem que sempre dure, E o meu, bem pouco durou. Não levantes os teus braços Para de novo cingir A minha carne de seda; - Vou deixar-te, vou partir! E se um dia te lembrares Dos meus olhos cor de bronze E do meu corpo franzino, Acalma A tua sensualidade Bebendo vinho e cantando Os versos que te mandei Naquela tarde cinzenta! Adeus! Quem fica sofre, bem sei; Mas sofre mais quem se ausenta!


Os Cantos de Maldoror

Duas coxas nervosas se colaram estreitamente à pele viscosa do monstro, como duas sanguessugas; e, os braços e as nadadeiras entrelaçados ao redor do corpo do objeto amado, rodeando-o com amor, enquanto suas gargantas e seus peitos logo formavam coisa alguma, a não ser uma massa glauca, com exalações de sargaços; no meio da tempestade que continua a provocar estragos; à luz dos relâmpagos; tendo por leito de himeneu a vaga espumosa, transportados por uma corrente submarina como em um berço, rolando sobre si mesmos, rumo às profundezas desconhecidas do abismo, juntaram-se em uma cópula longa, casta e horrorosa!... Finalmente, acabava de encontrar alguém semelhante a mim!... De agora em diante, não estava mais só na vida!... Ela tinha as mesmas idéias que eu!... Estava diante do meu primeiro amor!

Lautréamont 

Os Estatutos do Homem (Thiago de Mello)


Artigo I
Fica decretado que agora vale a verdade.
agora vale a vida,
e de mãos dadas,
marcharemos todos pela vida verdadeira.
Artigo II
Fica decretado que todos os dias da semana,
inclusive as terças-feiras mais cinzentas,
têm direito a converter-se em manhãs de domingo.
Artigo III
Fica decretado que, a partir deste instante,
haverá girassóis em todas as janelas,
que os girassóis terão direito
a abrir-se dentro da sombra;
e que as janelas devem permanecer, o dia inteiro,
abertas para o verde onde cresce a esperança.
Artigo IV
Fica decretado que o homem
não precisará nunca mais
duvidar do homem.
Que o homem confiará no homem
como a palmeira confia no vento,
como o vento confia no ar,
como o ar confia no campo azul do céu.


A Noite

Não consigo dormir.
Tenho uma mulher atravessada entre minhas pálpebras.
Se pudesse, pediria a ela que fosse embora,
mas tenho uma mulher atravessada em minha garganta.
Arranque-me, senhora, as roupas e as dúvidas.
Dispa-me.
Eu adormeço às margens de uma mulher: eu adormeço às margens de um abismo.

GALEANO

L'homme révolté - Albert Camus


A Queda

É como génese da revolta que o  tem lugar e só nessa medida podemos compreender a revolta, os sentimentos que lhe estão na base e as consequências que dela advêm. Mas  por que motivo? Porqueacontece que os cenários desabam. Os gestos de levantar, o carro – eléctrico, quatro horas de escritório ou de fábrica, refeição, carro – eléctrico, quatro horas de trabalho, refeição, sono e segunda-feira, terça, quarta, quinta, sexta e sábado no mesmo ritmo, esta estrada segue-se com facilidade a maior parte do tempo. Só um dia o ‘porquê’ se levanta (…).i É este "porquê" que nos torna estranha toda a nossa cadeia de hábitos e é neste preciso momento que a nossa vida começa a ruir- este é o momento do absurdo, o qual não é mais do que a estranheza do mundo, o mal-estar que sentimos, a "náusea", como lhe chamou Sartre, sendo na morte que ele adquire toda a sua grandeza. A morte é o desconhecido, o inefável e mais do que nunca nos põe face a face com a pergunta pelo sentido, isto é, vale a pena ter esperança apesar de tudo ou é preciso matarmo-nos?
O ser humano tem uma sede desmesurada de absoluto; quer compreender o mundo, quer reduzi-lo a si mesmo, quer fazê-lo seu, só que entre o mundo e o homem há um grande divórcio. Não se trata de uma exclusão ,mas antes de uma presença comum de duas realidades que são mutuamente alheias e ininteligíveis.
Tanto de si como do mundo, o homem só conhece estilhaços, pedaços aqui e acolá que de forma alguma lhe proporcionarão um verdadeiro conhecimento. De nada servirão ao homem as mais perfeitas e acabadas teorias da ciência que perversamente tudo pensam explicar, quando nem de si próprio o homem tem certezas!
O divórcio, a distância que separa o desejo incomensurável de unidade e de clareza do mutismo do mundo, é o próprio absurdo. Esta falta de coincidência entre o homem e o mundo, entre o homem e a natureza, abre um fosso entre o homem e as forças que o rodeiam e o absurdo expressa precisamente esse momento em que "se quebra a aliança com as coisas". Ao mesmo tempo que é divórcio, o absurdo acaba por ser o único elo de ligação entre o próprio homem e o mundo. No entanto, isto não conduz ao desespero na medida em que agora não se trata de medir a vida em termos de ter ou não ter sentido, pois é precisamente o "não ter sentido" que confere à vida um sentido, ou seja, não ter sentido é o seu sentido. Sendo esta a única certeza do homem, trata-se de saber se é, e como é possível viver com o absurdo. Mas se o absurdo é essa tensão entre o mundo e o homem, há que condenar necessariamente o suicídio na medida em que este seria a eliminação de tal divórcio; eliminar um dos pólos desta dicotomia (mundo/homem) será eliminar o absurdo- é necessário, pois, que se mantenham numa tensão perpétua.
De facto, todo este universo de angústia, de impotência e, por outro lado, o desejo de unidade não são tão originais de Camus. Muitos filósofos e pensadores nossos conhecidos se familiarizaram com esta temática: Kierkegaard, por exemplo, mais do que descobrir o absurdo, viveu-o de uma forma desesperada; Jaspers defende o nada como única realidade e o desespero como única atitude; Heidegger afirma-nos uma existência humilhada…
Tanto Kierkegaard, como Jaspers ou Heidegger se situam num espaço onde não há lugar para a esperança, só que embora tenham partido, de facto, do universo do absurdo acabaram por divinizar tudo aquilo que os oprimia, encontrando, por fim, a esperança, esperança esta de ordem religiosa. Jaspers dá um "salto" e transforma o absurdo em Deus ao afirmar um sentimento supra – humano da vida. A partir do momento em que a noção de absurdo serve de "ponte para a eternidade", já não está de forma alguma ligada à lucidez humana . O "salto" para Deus é o próprio fim do absurdo enquanto tal. É necessário que não exista esperança- este é o pressuposto da luto entre o homem e o absurdo.
Penso que é importante ter aqui em linha de conta a dificuldade de Camus na sua relação com Deus; por uma lado a inegável presença da ideia de Deus e, por outro, o inegável sentimento da sua ausência.
Ainda em Kierkegaard, o desejo de clareza deve renunciar a si mesmo para encontrar satisfação e isto não é mais do que dizer ao homem absurdo que haverá um final em que todas as contradições não passarão de jogos, isto é, há também em Kierkegaaard lugar para a esperança. Por isto mesmo, o homem absurdo não é o de Kierkegaard, mas sim aquele que se mantém fiel ao absurdo -a evidência que o despertou do seu sono fastidioso e quotidiano.
Olhar o absurdo é fazê-lo viver, e fazer viver o absurdo é viver! Se é necessário que se viva esse absurdo, se é necessário que não nos afastemos dele, só há uma saída coerente: a revolta. Esta revolta não é mais, no fundo, do que a luta eterna entre o homem em si e a sua opacidade.

Do not Disturbe - Parte 2

Eu digo
que não cabe
mais em lugar algum
essa indecência
essa putrefação
essa insipidez
essa agonia
essa acidez

Tudo me foge ao raciocínio
mas eu simplesmente
não curto mais as mesmas coisas
não suporto mais as mesmas pessoas
A eterna repetição

Não tem mais samba
Não tem mais rock
Não tem mais música
Me nego a acreditar que isso tudo seja legítimo
É apenas uma eterna repetição

De acordes, de letras, de passos de dança
Não passa de um plano forjado pra nos entreter
Não cuspo no prato que comi, comi com a mão.

Não Sei [ o que eu quero]

Não que eu tenha muito pela frente
Não que eu vá morrer tão cedo
Não estou abrindo mão de nada
Não estou dizendo adeus
Mas, e se a vida for isso?

E se eu for embora e não disser tudo aquilo que considero importante?
Quem vai saber o que devia ter sido feito, além de mim?
Então ninguém sentirá realmente falta tanto quanto eu
E se eu não puser os pés pra fora para agir?!

Não quero sangrar até morrer,
Não quero jogar eternamente
Pensar até secar a alma
Quero parar de sentir sozinha
Quero as bengalas bem-vindas da vida


sábado, 10 de novembro de 2012

Geração "Lennonista"

"Se vestem como Tarzan,
tem cabelo de Jane,
mas cheiram como a Chita."
 - Ronald Reagan,
então governador da California.
Referindo-se aos hippies (1967)

"I hope i die before get  old"
- Peter Towshed, The Who,
My Generation (1967)


O conceito polêmico de geração é um conceito marxista. Mas não leninista, e sim lennonista.
Adeus, Lênin, bem vindo Lennon! O marxismo-leninismo morreu, viva o marxismo-lennonismo!
E falar em geração é falar em geração baby-boom . Aquela geração que nasceu no imediato pós-II Guerra (meados dos anos 1940, início dos 1950) e que hoje já passou pela experiência de poder em várias partes do mundo. E como professor baby-boomer, nascido em 1951, sempre digo orgulhoso aos meus alunos, até  com certa empáfia, que pertenço a uma geração a uma geração totalmente mais: mais alta, mais ousada, mais inteligente, mais revolucionária, mais criativa. E mais mentirosa também!...
A geração baby-boomer está ultrapassando a maturidade. Cantada nos versos de Pete Towshed, do The Who, - em My Generation (1967): "i hope  i die before i get old" (espero morrer antes de ficar velho), a geração dos que nasceram e se formaram no contexto da Guerra Fria, da aventura espacial, da revolução científica e tecnológica, da emergência do rock, da revolução sexual, da luta pelos direitos civis, e que puderam testemunhar ou ate participar ativamente , de transformações importantíssimas, que até hoje assustam conservadores de vários tons e ideologias.

Martin Cézar Feijó
Professor de Comunicação Comparada da FACOM-FAAP

terça-feira, 9 de outubro de 2012

Associação Nacional de História (ANPUH) responde à crítica da Revista Veja sobre Hobsbawm


Em nota, entidade afirma que Veja teria reduzido historiador a um "idiota moral"
A nota de repúdio foi publicada no perfil da entidade no último sábado. Confira, na íntegra, o texto da Associação Nacional de História, que teve como título, "Hobsbawm: Um dos maiores intelectuais do século XX".
"Na última segunda-feira, dia 1 de outubro, faleceu o historiador inglês Eric Hobsbawm. Intelectual marxista, foi responsável por vasta obra a respeito da formação do capitalismo, do nascimento da classe operária, das culturas do mundo contemporâneo, bem como das perspectivas para o pensamento de esquerda no século XXI. Hobsbawm, com uma obra dotada de rigor, criatividade e profundo conhecimento empírico dos temas que tratava, formou gerações de intelectuais. Ao lado de E. P. Thompson e Christopher Hill liderou a geração de historiadores marxistas ingleses que superaram o doutrinarismo e a ortodoxia dominantes quando do apogeu do stalinismo. Deu voz aos homens e mulheres que sequer sabiam escrever. Que sequer imaginavam que, em suas greves, motins ou mesmo festas que organizavam, estavam a fazer História. Entendeu assim, o cotidiano e as estratégias de vida daqueles milhares que viveram as agruras do desenvolvimento capitalista. Mas Hobsbawm não foi apenas um “acadêmico”, no sentido de reduzir sua ação aos limites da sala de aula ou da pesquisa documental. Fiel à tradição do “intelectual” como divulgador de opiniões, desde Émile Zola, Hobsbawm defendeu teses, assinou manifestos e escolheu um lado. Empenhou-se desta forma por um mundo que considerava mais justo, mais democrático e mais humano. Claro está que, autor de obra tão diversa, nem sempre se concordará com suas afirmações, suas teses ou perspectivas de futuro. Esse é o desiderato de todo homem formulador de ideias. Como disse Hegel, a importância de um homem deve ser medida pela importância por ele adquirida no tempo em que viveu. E não há duvidas que, eivado de contradições, Hobsbawm é um dos homens mais importantes do século XX.
Eis que, no entanto, a Revista Veja reduz o historiador à condição de “idiota moral” (cf. o texto “A imperdoável cegueira ideológica da Hobsbawm”, publicado em www.veja.abril.com.br). Trata-se de um julgamento barato e despropositado a respeito de um dos maiores intelectuais do século XX. Veja desconsidera a contradição que é inerente aos homens. E se esquece do compromisso de Hobsbawm com a democracia, inclusive quando da queda dos regimes soviéticos, de sua preocupação com a paz e com o pluralismo. A Associação Nacional de História (ANPUH-Brasil) repudia veementemente o tratamento desrespeitoso, irresponsável e, sim, ideológico, deste cada vez mais desacreditado veículo de informação. O tratamento desrespeitoso é dado logo no início do texto “historiador esquerdista”, dito de forma pejorativa e completamente destituído de conteúdo. E é assim em toda a “análise” acerca do falecido historiador. Nós, historiadores, sabemos que os homens são lembrados com suas contradições, seus erros e seus acertos. Seguramente Hobsbawm será, inclusive, criticado por muitos de nós. E defendido por outros tantos. E ainda existirão aqueles que o verão como exemplo de um tempo dotado de ambiguidades, de certezas e dúvidas que se entrelaçam. Como historiador e como cidadão do mundo. Talvez Veja, tão empobrecida em sua análise, imagine o mundo separado em coerências absolutas: o bem e o mal. E se assim for, poderá ser ela, Veja, lembrada como de fato é: medíocre, pequena e mal intencionada."
São Paulo, 05 de outubro de 2012
Diretoria da Associação Nacional de História
ANPUH-Brasil
Gestão 2011-2013

sábado, 22 de setembro de 2012

Aos professores




Ninguém nega o valor da educação e que um bom professor é imprescindível.
 Mas, ainda que desejem bons professores para seus filhos, poucos pais desejam que seus filhos sejam professores.
Isso nos mostra o reconhecimento que o trabalho de educar é duro, difícil e necessário
, mas que permitimos que esses profissionais continuem sendo desvalorizados.
 Apesar de mal remunerados, com baixo prestígio social e responsabilizados pelo fracasso da educação,
 grande parte resiste e continua apaixonada pelo seu trabalho.
(Paulo Freire)

Comecei com esse pensamento de Paulo Freire e pensando em algumas perguntas que nos professores ouvimos
durante o percurso da graduação "Mas vocÊ não vai ter nenhuma profissão? Só professor?!"
Quero dizer que professor não é "só",  é tanto quanto qualquer profissão. Queria deixar uma mensagem aos colegas de profissão
Para que saiam da posição de reprimidos pelo sistema (é obvio que isso existe), que paremos com a história de profissão de
coitadinhos, saia da defensiva e partamos para o ataque. Professores, nós somos fortes candidatos à opressores, quando
em sala de aula obrigamos nossos alunos a compactuar com nossas ideias, nossos métodos, e nosso discurso é totalmente incoerente.
Professores que não gostam da profissão, larguem. O Brasil não precisa de mais professores frustrados, paremos de reclamar tanto
na sala dos professores, nos corredores das universidades. Discurso libertário de melhorias é so para inflar nossos egos, vamos
a realidade, aquilo que nos incomoda e nos maltrata todos os dias, vamos discutir a realidade a partir do que pode ser feito
e não a partir do passado. Os problemas são discutidos todos os dias, todos conhecem pelo menos uma parte de toda a estrutura
da educação, que parâmetros o modelo educacional brasileiro segue. Eu cansei de ver professores sendo o câncer de sua própria classe
Se graduem em outras áreas, mas por favor não passem essa desesperança para nossos alunos, a morte do pensamento da juventudade
está nos mais velhos ao passar toda a angústia de não ter seguido seus proprios passos enquanto Jovem. Somos manipuladores
da verdade quando acreditamos piamente que somos eternos oprimidos, maniqueísmo profissional, isso não deveria ser nosso jargão diário
Professor é, e se não for deve ser um eterno militante na luta pela educação.

terça-feira, 18 de setembro de 2012

Prologue to an illusion - Prólogo para uma ilusão


Don't worry,
 I do not expect anything from you
As winds experienced by small epiphanies,
 and comes back smoothly to its rightful place. I hope not commonly words like "love," "forever," or "never forget you"
This is the brilliance of youth believe that things can go right unsustainable.
 However, not in the world of ideas my mind works,
 not because I stole the dreams, but only because
 I believe it meets all is illusion, veil of maya.
_____________________________________________


Não se preocupe, eu não espero nada de você,
 como ventos sentidos por pequenas epifânias,
 vem  e volta suavemente para  seu devido lugar.
Não espero vulgarmente palavras como "amor", "para sempre", ou "nunca te esquecerei"
Esse é o brilho da juventude,
acreditar que as coisas insustentáveis podem dar certo.
 Entretanto, nem no mundo das ideias minha mente funciona,
Não porque me roubaram os sonhos,
 Mas porque so me satisfaz crer que tudo é ilusão, veu de maya.

   

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Ah, os italianos...


Na cabeça o tilintar das taças ao som de Tchaikovsky em algum café em Paris, entra um italiano “meia idade”. Sim, um italiano! Nos meus sonhos parisienses não há espaço para o preconceito europeu, há apenas a imagem do homem casual que entra e perde o fôlego como se estivesse esperando alguém que nunca iria aparecer. O som ambiente era o que dava o aspecto diferenciado daquele homem, pois um italiano entre tantos franceses merecia um toque musical de erudição. Na pele de ninfeta logo me senti alvejada pelos feromônios que incrivelmente borbulhava entre minhas pernas e quase conseguia tocá-los. Rubor? Jamais. Uma dama jamais pode demonstrar fraqueza diante de um italiano, não apenas pela fama de amantes insaciáveis ou pela destreza com as mãos e boca, mas pela barganha feminina de ousar não entregar de corpo e feromônios de primeira a uma sedução tão efêmera quanto a de um italiano. Quanta ênfase a uma nação masculina! O fato é que homens autossuficientes são perigosos, ao som de Tchaikovsky em Paris então, nem se fala. Aquele café era formal demais para uma noite sexualmente atrativa, o que eu precisaria era de uma aproximação mais descarada, afinal,  o que eu conseguiria em um café além de números de telefones de um estrangeiro? Vocês devem se perguntar como consegui distinguir um italiano no meio de tantos franceses, entretanto uma mulher preparada sabe farejar a polidez de um italiano que se preze. Contudo, jamais poderíamos profetizar porque um homem  tão seguro de si estaria perdendo o fôlego, talvez se eu fingisse uma indiscrição confusa entre um sotaque italiano e um inglês meia boca que realmente me fizesse ruborizar, poderia pretensiosamente me aproveitar dessa falta de ar. Entre o pensar e o agir há uma distância moral que me segurou por uns dez minutos, em que meus olhos fingiam ler os compostos da margarina em cima da mesa. Atrevidamente levanto dando ênfase ao pescoço e ao colo que estavam devidamente preparados com os cabelos amarrados e um vestido com alças finíssimas que quando em vez escapuliam ao ombro. O processo de ida até o banheiro é seguido por um leve e fingido tropeço sendo reconduzido pela ajuda apática de um garçom e uma olhada sem afetos do italiano, que logo voltou ao compasso da música e da bebida. À essa hora Bach já havia entrado triunfante no cenário, chello no prelude 01, sim justamente essa sonorizando minha quase queda, pensando em outra alternativa decidi que um Moët & Chandon ajudaria a criar coragem e fui até o bar, me posicionei, nem tão distante que ele não pudesse me notar, nem tão perto que insinuasse uma aproximação intencional. Tão logo pedi a taça, soltei um suspiro desajeitado de quem espera cansada e com sede o primeiro gole de álcool da noite, apesar desse ser o único ato espontâneo da noite, foi ele mesmo quem chamou a atenção do “meia idade” de Toscana,  que surpreendentemente falava inglês muito bem. As ironias disso tudo: um italiano em Paris falando inglês! Entretanto além das ironias havia um demorado vinho que parecia contribuir para que o dito cujo perguntasse seu realmente considerava Paris o centro das revoluções e transformações do mundo moderno ou se tudo não havia sido forjado por uma França cheia de si. Eu, obviamente só entendi o “cheia de si”, mas com uma sagacidade impecável respondi que a retórica da tradição francesa era uma necessidade que eles (seja lá quem for os “eles”) , foi quando o meu Moët & Chandon de salvação chegou e interrompeu a minha resposta sem propósito, tomei um infalível gole e disse que adoraria não contribuir para a arrogância francesa. O sorriso de canto dele era proporcional a minha sutileza que estava escondida em mãos suadas segurando firmemente a taça. Ele continuou sério, apesar de o semblante cultivar uma leveza, que me condenou a continuar nessa empreitada, ao me levantar ele pronunciou o que me parecia improvável e disse que esperava ansiosamente uma italiana que conheceu ali naquele mesmo local dias atrás, entretanto deixou em aberto se era um encontro ou se esperava que o acaso agisse. A curiosidade quase  me levou a perguntar qual das duas probabilidades era a mais aceitável, me calei e disse que hoje era a noite das ironias, um italiano esperando outro em Paris. Ia voltando para minha mesa quando surgiu o convite para terminar  a garrafa de Moët & Chandon em um espaço menos melancólico, talvez seria difícil achar um pub estilo irlandês em Paris, mas ainda existia a sordidez etílica da Belle Époque,  em que se bebia, comia e fazia-se sexo com qualidade considerável. Perguntei se a italiana não se incomodaria com minha presença, respondendo ao que seria uma pergunta obvia em relação ao seu status civil, disse que a ausência dela era um fato fúnebre que merecia ser contado compassadamente em um espaço com melhores acomodações. Não foi difícil encontrar um local que conotasse sexo e bebidas, afinal, nem só de amor romântico vivem os parisienses, as mesas dispostas separadamente umas das outras com meia luz ao som de 13& God, uniu o que alguns clamariam por socorro, nada mais paradoxal que é um clássico Moët & Chandon com um som indie alemão misturado com o som norte-americano.  Não se sabia que poderia haver um sincretismo sinestésico entre o clássico e o profano. A singularidade daquele momento era perturbadoramente excitante, exceto pelo fato de que a visão da italiana se tornara mais fúnebre do que a própria história ainda escondida. Inicialmente o nome do italiano foi apenas balbuciado, não prestei muita atenção no que parecia ser essencial (ou trivial), a vontade era de não conhecer sua identidade, os que aos poucos se tornou facilmente aceitável para os dois. O inicio da conversa foram apenas solilóquios entre o que ele pensava e o que ele pensava, iniciou comentando como falava inglês em um espaço hostil para tal idioma e que teve de sair de Toscana para encontrar alternativas profissionais. Até esse momento o encanto estava quase se tornando desencanto, quando finalmente iniciou a história fúnebre referida no café, em que a italiana esperada no bar jamais chegaria, não porque estivesse morta, mas pelo fato de que ele não a conheceu pessoalmente, era apenas divagações de alguém que reconhece um conterrâneo em outros espaços, porém, era fúnebre pois encontrá-la novamente seria uma obra do acaso ou do impossível, exceto o detalhe da cegueira parcial que a impediu de reconhecer um italiano em terras francesas, não era trágico, muito menos fúnebre mas ele sabia que eu jamais aceitaria o convite se soubesse que ele iria direto as “vias de fato”. O vinho foi posto e recolhido, estávamos levemente “alegres” quando soou World Outside ,  tecnicamente estávamos próximos do que qualquer pessoa chamaria de sexo casual, no entanto a música retardou um pouco  nossa ida ao lado mais escuro do bar. Sua conversa cheia de pretensões filosóficas impulsionou um sono auxiliado pelo vinho, contudo o charme de um italiano não acaba com um vinho e algumas arrogâncias platinadas em Fellini. Suas mãos começaram a deslizar pelo ombro despido, o que me arrepiava não era possibilidade do sexo, mas do não sexo, aquilo que poderia ser destruído por um mínimo detalhe, como um toque errado, uma palavra não pronunciada, afetava meu sangue de mulher fatal, o sentimento de jovialidade e bestialidade poderia transtornar minha segurança. Tudo foi congelado quando a primeira oportunidade do beijo apareceu, em duas bocas sem assunto cabem perfeitamente beijos quentes, sedutores, cheios de língua e de saliva, lábios carnudos sempre me fascinaram. A boca maravilhosamente proporcional a minha deixou que meus feromônios exalassem pelo espaço ocupado por nos dois na mesa. Para um vestido bem preparado há sempre uma mulher sem calcinha, que propositalmente deixa que ele saiba de tal situação, ao conhecer tais objetividades de uma mulher moderna o vestido é levantado com uma sutileza que jamais perceberia a ausência dele, contudo a presença de uma mão quente entre as pernas denunciava a roupa entre sua cintura que não poderia ser evitado, caso houvesse necessidade. Novamente, sinto a jovialidade de uma adolescente transando no banco de trás do carro do namorado, só que a culpa não é a mesma, o que torna o sexo bem mais leve. Entretanto, entre a praticidade de um vestido e a complexidade de uma calça com zíper tornou o que chamamos de situação complicada, não pela calça em si, mas pelo local, chamar atenção dessa forma seria desnecessário. Sua atenção voltava-se para que não houvesse gemidos altos que atraíssem plateias, o tráfego de pessoas naquele bar era quase nulo, mas os poucos que o frequentavam estavam atentos a qualquer som estranho. A sinalização de que estávamos em uma situação unilateral foi que sua mão estava molhada e a calça ainda estava fechada, porém se partíssemos agora, tínhamos o conhecimento de que o clima seria quebrado e cada um partiria seja lá qual fosse o destino, continuamos então discretamente para o quase impossível, sentar em cima de suas pernas com a calça semi-baixa, o contraste entre as luzes vermelhas do bar e a escuridão da noite proporcionou uma discrição quase impossível, difícil seria calar a boca em um sonorizado gemido. A princípio, sentar foi fácil, a mão na boca também, mas a flexibilidade de um italiano deixou a desejar, são bons amantes em seus devidos espaços, lugares mais exóticos causam medo, não sei se é particularidade de pessoas desse país, ou o proibido gera bloqueio. O fato é que apesar do meu esforço a participação continuou unilateral, até que em uma gozada triunfal saí de cima aliviada, afinal as reclamações de que as mulheres são mais paradas na cama nem sempre procedem, nem sempre é na cama, nem sempre falhamos, nem sempre italianos são bons amantes, nem sempre locais inusitados proporcionam transas inesquecíveis.

domingo, 26 de agosto de 2012

Aviso aos navegantes

Mulher adora uma mentira bem contada
Adora saber que seus braços são os mais confortáveis
Que seus lábios são os mais doces
Que suas palavras são as mais sedutoras
Não precisa ser verdade
Mas mulher adora uma mentira bem elaborada
Daquelas que dizem que seu corpo é o mais sublime
Que suas curvas são as mais perigosas
Não precisa se esforçar, basta balbuciar algumas palavras
Fingir alegria, fingir tratamento,
Mulher adora de vez em quando se achar na frente da barganha
O destino da mulher é ser admirada, ser interpretada, mesmo que seja nas entrelinhas
Mulher, enfim, adora se achar em eterno festim

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Dia de quem?


No Dia do Historiador, pesquisadora da RHBN faz uma reflexão sobre alguns valores atribuídos à profissão e questiona o significado da instituição de uma efeméride dedicada a ela

Nashla Dahas
Talvez seja necessário retirar da história parte do peso de carregar um passado coerente e preciso, fundamento mais seguro das identidades. Equivaleria a distribuir as chaves para um universo que não precisa acabar, no qual o homem é destituído de uma posição de domínio, de um modo de ser determinado por conjuntos de variáveis mais ou menos previsíveis, pois que alicerçadas em colonizadas relações de unidade e identidade.
  • Há mais de 500 anos um enorme contingente de pessoas caminha entre o mito do paraíso perdido e as descobertas mais fantásticas no campo das ciências e tecnologia, da economia mundial, e da comunicação extravagantemente massiva. A vida tem sido tecida por múltiplos processos sociais que garantem a manutenção dessas condições, aspiração e profundo desejo de um futuro desenvolvido e eternamente mais moderno. E neste amplo arco de um conceito um tanto oportunista de “modernidade” consideramos os encurtamentos geográficos e as aproximações étnicas, a estigmatização dos conflitos de classe, raça e nacionalidade, religião e ideologia, na esperança de alcançar o comando da própria história.

    Reconhecimento
    Da aventura do descobrimento humano nos séculos XV e XVI, a inelutável sociedade “global” contemporânea, o problema do reconhecimento e da demarcação das identidades culturais combinou-se a um desejo de modernização social e desenvolvimento econômico a-históricos, pois que diluídos em fragmentários caminhos distantes de qualquer referência de transformação que marcou esses séculos de experiências. A linha reta do passado institucionalizado chamou de civilização a exclusão política, e de tolerância cultural, o racismo das opções modernas de inclusão.
    O Ocidente tornou-se o lugar por excelência da liberdade, desde que as diferenças identitárias estejam devidamente elencadas e asseguradas pela lei – cujo argumento fundamental tem sido repetidamente a História. Ao mesmo tempo, do espírito moderno de ruptura que marcou finais do século XIX, não cultivamos atualmente qualquer referência, profundidade ou sentido e começamos a nos chamar de pós-modernos, decretando o fim daquela história, novamente, como se isso fosse possível. Formatamos o inconsciente individual e o acaso histórico, o desejo pessoal de mudança e a democracia participativa em um capítulo da história em direção a uma infinidade de novas, atraentes e perturbadoras experiências e memórias incapazes, contudo, de nos municiar da compreensão de quem somos e qual o nosso lugar.
    No Brasil, ora discutimos no campo político a verdade unívoca de capítulos de nossa história, comemoramos de forma perturbadora a chegada do futuro sem demonstrar qualquer empatia pelas já antigas lutas de classe, lutas sociais, conflitos e contradições psicológicas que constituíram gerações tragadas por um passado de datas e monumentos, mas sem qualquer conexão com a imagem futurista de nosso presente. O modelo ideal de sociedade responsabiliza a agitação social e suas incertezas por um fracasso determinista confinado às histórias contadas nas salas de aula, às bibliotecas universitárias, aos museus e patrimônios culturais, distantes, portanto, da ampla sensibilidade social, das ruas, do espaço público e da memória, na qual todos os sentimentos humanos de senso de pertencimento, compreensão e atividade, sexualidade e desejos podem ser inventados e reinventados todos os dias de acordo com as necessidades e interesses pessoais.
    Diante disso, talvez a ambigüidade do conhecimento histórico, a consciência da incerteza do progresso, do acaso e do devir devam ser postas em causa. Deixemos por um momento a homenagem mais problematizadora do estudo do passado, para abrir mais espaço ao erro e a ilusão, obscurecidos pelo desejo colonial de modernidade. Que as oportunidades de mobilidade e transformação moral desde muito sonhadas, assim como a incansável busca de crescimento econômico e humano não lancem nossa secularidade a categorias cristalizadas em datas e acontecimentos. Mas que o dia de hoje seja mais uma chance de reflexão sobre nossos vínculos emocionais com uma imensa trajetória de lutas, diversidade e possibilidades de vida, de valores, de alternativas de futuro.

    Texto publicado na revista de Historia da Biblioteca Nacional

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

"Revolution"


Gritem, babacas
Gritem o quanto a sociedade é injusta
o quanto você odeia corrupção
vote nulo
boicote eventos
seja o engajado perfeito
Poste em suas redes sociais o quanto você odeia que maltratem os poodles, as crianças e os velhos
Disserte sobre o preconceito
Diga não às campanhas políticas no facebook
Seja o ativista online
que não move a bunda pra ir às ruas
que não perde tempo assistindo o horário eleitoral e muito menos vai a um debate político
Depois não venham com fotos de Brasília e um pedido pro Bin Laden acabar com ela
Nós a construímos,
Nós colocamos cada um dos corruptos
O sonho de cada brasileiro é poder ter uma bagatela do que nossos representantes conseguem
O sonho do oprimido é ser opressor
O sonho do brasileiro é poder se esbaldar em falcatruas sem ser pêgo
É ser o bom cristão, o bom pai, o bom cidadão
Não tem coragem nem de catar o próprio lixo, mas adora um discurso libertário

Ode aos hipócritas


No alto da madrugada
o teu sexo vem à tona
No tilintar do copo de vodka
nos corpos se consomem
ao som do blues
enlaçando-me e esquecendo as mágoas
a gente se afoga
so molha e se pinta de festim

O que ocorre é que ao amanhecer
o dinheiro do taxi tá na mesa com um bilhete pra fechar a porta
o dinheiro estava trocado
e você roncava
não pude deixar de notar alguns discos do Bob Dylan na prateleira
Peguei dois, afinal, pra quem não me dá carona a noite é mais cara

domingo, 19 de agosto de 2012

Poço de candura


Aos olhos do mundo
Como você é normal
Com suas roupinhas sensuais
seus olhinhos de puta
sua fineza requintada em balada
seu gosto comedido, com um leve toque de quem não escuta nada além da moda

Seu corpo de pilastra que não se mexe na cama
Suas roupas pagas a prestação
Nada contra as prestações, mas tua vontade de se exibir é o alvo da minha admiração
Posso estar parecendo uma porca chauvinista
Que seja, insuportável é tentar te apreciar

Não é preciso ir longe pra encontrar você no atacado e no varejo
São tao dengosos esses teus gemidos, que até ouço o relinchar das éguas
Potrancas doidas pra acasalar
Tua incorporação de boa moça de família me faz rir
Quem disse que puta nao tem família?

Do not disturbe


Mais um dia de ressaca na província
meu olhos doem, essa rinite me matando
Faculdade entorpecida de intelectuais de quinta
consumindo cultura e vomitando arrogância
Dou meus pulos, fujo do marasmo
Saudades do meu valium

O tédio se prolonga por todas as ruas, por todos os bares
os livros sao folheados, as bebidas acabam
nada de novo no front
a regra é beber até cair, até esquecer aquela vadia
até esquecer que eu não posso ser mais do que eu sou
até poder me mandar, pra qualquer lugar

A didática não me ensinou a me auto apreciar
Enquanto as professoras falam so imagino fodas legais
Até que nao seria má ideia, calar a boca e foder quem so sabe divagar

Preciso daquilo que me faz tanta falta
Não é voce sua cadela, preciso de vodka
Acabou a porra da vodka e você aí gastando saliva achando que é com você

Historiador

Veio para ressuscitar o tempo 
e escalpelar os mortos, 
as condecorações, as liturgias, as espadas, 
o espectro das fazendas submergidas, 
o muro de pedra entre membros da família, 
o ardido queixume das solteironas, 
os negócios de trapaça, as ilusões jamais confirmadas 
nem desfeitas. 

Veio para contar 
o que não faz jus a ser glorificado 
e se deposita, grânulo, 
no poço vazio da memória. 
É importuno, 
sabe-se importuno e insiste, 
rancoroso, fiel. 

Carlos Drummond de Andrade, in 'A Paixão Medida'

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Porto Alegre, 10 de agosto de 1985 - Caio Fernando Abreu

"... isso que chamamos de amor, esse lugar confuso entre o sexo e a organização familiar..."

Sérgio, não sabia como começar - então comecei copiando essa frase aí de cima, é Caetano Veloso numa entrevista ao JB, vim lendo pelo caminho, não consegui me livrar dela.

Agora estou aqui, escrevendo para você no meu quarto antigo, que minha mãe conserva tal-e-qual, como se eu um dia fosse voltar para casa. E lá se vão - quantos mesmo? - sei lá, quinze vinte anos, qualquer coisa assim.

Chove. Faz frio. É bom estar aqui. Tão bom. Me sinto protegido. Ficamos vendo velhas fotografias, bebendo vinho e rindo muito. Meu irmão Felipe vestiu um modelinho de couro negro e saiu "para dar uma prensa numa caixa de supermercado". Márcia está tão bonita. E Rodrigo, meu sobrinho, que tem dois anos e não parece quase me desconhecer. Deixei-os vendo um filme antigo dos Beatles, Lennon repetindo "don´t let me down" - e agora percebo que meu inglês anda tão precário que não lembro se é d´ont ou don´t.

Cansado, cansado. Quase não dormi. E não consigo tirar você da cabeça. Estou te escrevendo porque não consigo tirar você da cabeça. Hesito em dizer qualquer coisa tipo me-perdoe ou qualquer coisa assim. Mas quero te contar umas coisas. Mesmo que a gente não se veja mais. Penso em você, penso em você com força e carinho. Axé.

Foi mau, ontem. Fui mau, também. Menos com você, mais comigo mesmo. Depois não consegui dormir. Me bati pela casa até quase oito da manhã. Teria telefonado para você, não fosse tão inconveniente. Acabei ligando para Grace, pedi paciência, chorei, contei, ouvi.

Não era nada com você. Ou quase nada. Estou tão desintegrado. Atravessei o resto da noite encarando minha desintegração. Joguei sobre você tantos medos, tanta coisa travada, tanto medo de rejeição, tanta dor. Difícil explicar. Muitas coisas duras por dentro. Farpas. Uma pressa, uma urgência.E uma compulsão horrível de quebrar imediatamente qualquer relação bonita que mal comece a acontecer. Destruir antes que cresça. Com requintes, com sofreguidão, com textos que me vêm prontos e faces que se sobrepõem às outras. Para que não me firam, minto. E tomo a providência cuidadosa de eu mesmo me ferir, sem prestar atenção se estou ferindo o outro também. Não queria fazer mal a você. Não queria que você chorasse. Não queria cobrar absolutamente nada. Por que o Zen de repente escapa e se transforma em Sem? Sem que se consiga controlar.

Te escrevo com um cigarro aceso e uma xícara de chá de boldo. A escrivaninha é muito antiga, daquelas que têm uma tampa, parece piano. Tem um pôster com Garcia Lorca na minha frente. Um retrato enorme de Virginia Woolf. E posso ver na estante assim, de repente, todo o Proust, e muito Rimbaud, e Verlaine, Faulkner, Ítalo Svevo, William Blake. Umas reproduções de Picasso. Outras de Da Vinci. Um biscuit com um pierrô tão patético. Uma pedra esotérica ainda de Stonehenge, Inglaterra, uma caixinha indiana. Todos os meus pedaços aqui.E você não me conhece, eu não conheço você.

Te escrevo por absoluta necessidade. Não conseguiria dormir outra vez se não te escrevesse.Zelda, há também o único romance escrito por Zelda Fitzgerald, a mulher de Scott Fitzgerald, que morreu louca, um incêndio, um hospício. Chama-se "Save me the waltz". "Reserve-me a valsa", não é lindo? Lembra o Brahma, se se dançasse no Brahma.

Please, save me the waltz.

Fiz fantasias. No meu demente exercício para pisar no real, finjo que não fantasio. E fantasio, fantasio. Até o último momento esperei que você me chamasse pelo telefone. Que você fosse ao aeroporto. Casablanca, última cena. Todas as cartas de amor são ridículas. Esse lugar confuso de que fala Caetano. E eu estava só começando a entrar num estado de amor por você. Mas não me permiti, não te permiti, não nos permiti. Pedro Paulo me dizendo no ouvido "nunca vi essas luz nos seus olhos".

Eu não queria saber.Tão artificial, tão estudado. Detesto ouvir minha voz no gravador ou ver minha imagem em vídeo. Sôo falso para mim mesmo. A calma, o equilíbrio, as palavras ditas lentamente, como se escolhesse. Raramente um gesto, um tom mais espontâneo. Tão bom ator que ninguém percebe minha péssima atuação.

Você compreende tudo isso?

Pausa. Campainha. O jornal de domingo. Desço, outro chá de boldo. Um comentário de Rubens Ewald sobre Aqueles dois, diz que é excelente, fala da "dignidade e tratamento delicado dado ao tema". Lembro da crítica de Sérgio Augusto, de como fez mal por dentro. Já passou.

Quando pergunto você-compreende-tudo-isso não estou subestimando você. Ah, deus, perdoe. Não sinto agressividade nenhuma em relação a você. E gosto das tuas histórias. E gosto da tua pessoa. Dá um certo trabalho decodificar todas as emoções contraditórias, confusas, soma-las, diminui-las e tirar essa síntese numa palavra só, esta: gosto.

Dormi umas três horas e acordei ouvindo Quereres, de Caetano. Repeti, várias vezes, cada vez mais alto. Ah, bruta flor do querer. Discutia tanto com Ana Cristina César, antes que ela acolhesse a morte (acertadamente? Me pergunto até hoje, nunca sei responder): nossa necessidade fresca & neurótica de elaborar sofrimentos e rejeições e amarguras e pequenos melodramas cotidianos para depois sentar Atormentado & Solitário para escrever Belos Textos Literários.

O escritor é uma das criaturas mais neuróticas que existem: ele não sabe viver ao vivo, ele vive através de reflexos, espelhos, imagens, palavras. O não-real, o não-palpável. Você me dizia "que diferença entre você e um livro seu". Eu não sou o que escrevo ou sim, mas de muitos jeitos. Alguns estranhos.

Não há nenhum subtexto nisto que te escrevo. Não acho bonito que a gente se disperse assim, só isso. Encontre, desencontre e nada mais, nunca mais, é urbano demais - e eu nasci praticamente no campo, até os 15 anos quase no campo, céu e campo. Não sei se a gente pode continuar amigo. Não sei se em algum momento cheguei a ver você completamente como Outra pessoa, ou, o tempo todo, como Uma Possibilidade de Resolver Minha Carência. Estou tentando ser honesto e limpo. Uma possibilidade que eu precisava devorar ou destruir. Porque até hoje não consegui conquistar essa disciplina, essa macrobiótica dos sentimentos, essa frugalidade das emoções.

Fico tomado de paixão.Há tempos não ficava.

E toda essa peste, meu amigo. O que tem me mantido vivo hoje é a ilusão ou a esperança dessa coisa, "esse lugar confuso", o Amor um dia. E de repente te proíbem isso. Eu tenho me sentido muito mal vendo minha capacidade de amar sendo destroçada, proibida, impedida, aos 36 anos, tão pouco. Nem vivi nada ainda. E não sou sequer promíscuo. Dum romantismo não pós, mas pré todas as coisas - um romantismo que exige sexualidade e amor juntos. Nunca consegui. Uns vislumbres, visões do esplendor. Me pergunto se até a morte - será? Será amor essa carência e essa procura de amor, nunca encontrar a coisa?

Das minhas heterossexualidades, dois filhos mortos, não ficou nada. Das minhas homossexualidades, esse pânico lento e uma solidão medonha. A hora é tão grave.

Vim pegar energia. Sim. Preciso ver a terra, preciso do horizonte do pampa. Já começa a agir, meus ombros se soltaram. Olhei no espelho e aquela ruga entre as sombrancelhas se desfez.

Não quero me tornar uma pessoa pesada, frustrada, amarga. Não vou me tornar assim.Então vacilo, escorrego e a mania de perfeição virginiana e a estética libriana no dia seguinte me dizem "que vergonha, que vergonha, que vergonha".

Eu podia dizer que tinha/tínhamos bebido demais. Eu podia dizer que estava com tanto medo de vir para Porto Alegre. Eu podia contar a você dos meus últimos meses, oito, dez, doze horas por dia sobre a máquina de escrever, falando com quase ninguém. Sozinho, às vezes. Cantando também. Tudo isso, se eu te dissesse, talvez tivesse ajudado a doer menos em você.

De repente me passa pela cabeça que você pode estar detestando tudo isso e achando longo e choroso e confuso. Mas eu não quero ter vergonha de nada que eu seja capaz de sentir. Tento não ficar assustado com a idéia que este tempo aqui é curto, que eu vou voltar a São Paulo e que talvez não veja mais você. Sei que não fico assustado demais, e enfrento, e reconstituo os pedaços, a gente enfeita o cotidiano - tudo se ajeita. Menos a morte.

Mas de tudo isso, me ficaram coisas tão boas... Uma lembrança boa de você, uma vontade de cuidar melhor de mim, de ser melhor para mim e para os outros. De não morrer, de não sufocar, de continuar sentindo encantamento por alguma outra pessoa que o futuro trará, porque sempre traz, e então não repetir nenhum comportamento. Ser novo.

Quando te falo da idade, quando te falo do tempo, e não tivemos tempo - queria te falar de Cronos, Saturno, da volta pelo Zodíaco quando se completa 30 anos. A tua estrela é muito clara, tem sinais bons na tua testa. Compreendo teu Plutão e a Lua encarcerados na casa XII - as emoções e paixões aprisionadas -, e também Urano, todo o impulso bloqueado. Na mesma casa, a do Karma, a dos espíritos que mais sofrem, tenho também o Sol, Mercúrio e Netuno. Somos muito parecidos, de jeitos inteiramente diferentes: somos espantosamente parecidos. E eu acho que é por isso que te escrevo, para cuidar de ti, para cuidar de mim - para não querer, violentamente não querer de maneira alguma ficar na sua memória, seu coração, sua cabeça, como uma sombra escura. Perdoe a minha precariedade e as minhas tentativas inábeis, desajeitadas, de segurar a maçã no escuro. Me queira bem.

Estou te querendo muito bem neste minuto. Tinha vontade que você estivesse aqui e eu pudesse te mostrar muitas coisas, grandes, pequenas, e sem nenhuma importância, algumas.Fique feliz, fique bem feliz, fique bem claro, queira ser feliz. Você é muito lindo e eu tento te enviar a minha melhor vibração de axé. Mesmo que a gente se perca, não importa. Que tenha se transformado em passado antes de virar futuro. Mas que seja bom o que vier, para você, para mim.

Com cuidado, com carinho grande, te abraço forte e te beijo,

Caio F.

p.s.: Te escrevo, enfim, me ocorre agora, porque nem você nem eu somos descartáveis. E amanhã tem sol.